Não
foi fácil ler esse livro, não pela estrutura do texto – simples e
bem escrito –, mas pelos detalhes da narrativa. Cabul no Inverno: Vida sem paz no Afeganistão é uma obra melancólica, fala do
sofrimento do povo afegão, mas, na minha visão, muito mais dos
tormentos vividos pelas mulheres, consideradas inferiores naquele
país.
Ann
Jones é autora e também jornalista. Seu trabalho é levar ajuda
humanitária a várias partes do mundo e contar suas histórias,
principalmente em relação às mulheres, como bem podemos notar em
Cabul. Ela resolveu seguir para o Afeganistão após os ataques do 11
de setembro de 2001 e invasão dos EUA na chamada “Guerra ao
Terror”, instituída pelo então presidente da época George W.
Bush.
A
comoção e crença de que os EUA tinham perdido o rumo da guerra,
levou a jornalista a seguir pelo caminho mais árduo. No seu ponto de
vista, “os Estados Unidos são capazes de uma ação mais criativa
do que bombardear um país pequeno, indefeso, pré-destruído do
outro lado do mundo”, por isso, ela sentiu a necessidade de fazer
algo por aquele povo.
Logo
nas primeiras páginas, Ann traz referências geopolíticas, sociais
e culturais que assolam o Afeganistão. Lá, encontrou cenas,
condições e situações nada alentadoras. A devastação
atormentava as mulheres que haviam perdido pais, maridos, irmãos e
filhos na gerra. Num país onde são obrigadas a saírem de casa
somente com um parente do sexo masculino, as viúvas de Cabul
passavam fome e ficavam à mercê da própria sorte.
A
guerra sem fim
Com
a saída dos EUA e antiga União Soviética, a região eclode em uma
nova gerra – agora, civil – pelo controle da capital e do país.
Esses detalhes são contados na primeira parte do livro – são
três. Na segunda, Jones fala das prisões. Prisões essas que são
físicas, mentais e cultural.
Depois
dos atentados, os homens que sobreviveram a tudo, voltam para casa
ainda mais violentos. O sentimento de incapacidade leva-os a loucura
constante, já que, naquele momento, não serviam para mais nada:
estavam desempregados, não eram mais soldados e também não tinham
o que fazer da vida. Por isso eles espancavam e estupravam as
mulheres, e num reflexo de ódio elas espancavam os filhos que
descontavam nos cães: “as crianças amarravam os cachorros e
davam-lhes bordoadas com um bastão até que eles se despedaçassem”.
E
não é só isso. Jones conta diversos casos de mulheres que sofreram
inúmeros assédios. Levam a culpa por tudo, e a única saída que
encontram é atear fogo ao próprio corpo com a esperança de cessar
o sofrimento: a morte é a única saída. No entanto, as que
sobrevivem agonizam pelo resto da vida.
São
muitas histórias de partir o coração. Violências sem precedentes
que atingem crianças entre 7 e 8 anos com casamentos comprados que
as traumatizam e deprimem. Muitas fogem e outras são levadas para o
hospital, sangrando, no dia seguinte à noite de núpcias. Aos 12
estão gravidas, algumas morrem porque o corpo não está
desenvolvido o suficiente para dar à luz. Sim, o livro é pesado,
mas dói mais por saber que são relatos reais.
Na
última parte da obra, a autora foca no sistema educacional: o pior
do mundo. As crianças aprendem a recitar o Corão, por exemplo, mas
não a ler e escrever seu próprio idioma. Pouquíssimas meninas
estudam até, no máximo, a quinta série. Cerca de 95% da população
é analfabeta.
Conclusão
Foto: DW/Faridullah Zahir e do livro: Viviane Andrade
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