Uma nova pesquisa coloca Machado de Assis, ícone da literatura brasileira, sob um olhar crítico. Segundo Élide Valarini Oliver, professora da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, o autor teria plagiado um texto no início de sua carreira.
O caso envolve a crônica “Carniceria a Vapor”, divulgado por Machado em 1860 no periódico “A Marmota”, quando tinha 21 anos.
No artigo intitulado “Machado de Assis: de Porcos e Plágios”, publicado na Revista USP, Élide analisa detalhadamente as fontes do texto e aponta uma possível apropriação indevida de trechos de um artigo do periódico francês L’Année Scientifique et Industrielle, que resumia o livro Trois ans aux États-Unis, do escritor Oscar Comettant.
Apesar de Machado de Assis mencionar Comettant como fonte, a pesquisa sugere que o autor brasileiro utilizou diretamente o conteúdo francês, sem creditar a publicação.
A comparação entre o texto de Machado e o artigo original revela semelhanças significativas, tanto na estrutura quanto no vocabulário utilizado. Em um trecho do periódico, por exemplo, é descrito o funcionamento de uma moderna usina de processamento de porcos nos Estados Unidos.
Machado reproduz essa descrição em “Carniceria a Vapor” com poucas variações, substituindo termos e reordenando parágrafos, mas mantendo a essência do conteúdo plagiado.
Segundo Élide, essas coincidências indicam que o texto de Machado não se baseia diretamente no livro de Comettant, como ele sugere, mas sim no artigo do periódico francês, que já havia resumido a obra.
A professora levanta a hipótese de que Machado teria adotado essa estratégia para disfarçar o uso da fonte original, prática que, nos critérios atuais, poderia ser caracterizada como plágio.
O estudo também destaca a ausência de citação direta ao jornal por parte de Machado, o que reforça a tese de apropriação textual.
A prática de "traduções criativas", comum no século XIX, pode ter influenciado o jovem escritor, que reescreveu o conteúdo com adaptações estilísticas, mas sem indicar a verdadeira origem das informações.
Embora o estudo apresente evidências robustas, ele também suscita uma reflexão sobre a forma como a autoria e a originalidade eram compreendidas na época.
No século XIX, os conceitos de tradução e adaptação eram mais flexíveis, o que pode ter levado Machado de Assis a adotar um método que, nos padrões contemporâneos, seria visto de maneira diferente.
Foto: Ilustração
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